sábado, 27 de março de 2010

Eu não sou da sua rua

Eu não sou da sua rua,
Eu não falo a sua língua,
Minha vida é diferente da sua
Estou aqui de passagem
Esse mundo não é meu

Essa música, do Branco Mello e Arnaldo Antunes – lindamente interpretada por Marisa Monte, nunca foi tão verdade pra mim como hoje.
Quem sabe onde eu estou morando e por que eu moro aqui, sabe também das crises que eu tenho de vez em quando por morar num bairro desses. Tá, a história é longa e em um outro post eu conto. Mas moro no 2º metro quadrado mais caro de São Paulo. O bairro é ultra chique, apesar de contrastar com a feiura suja da av. Santo Amaro, em um dos seus piores pontos.
Mas vivendo aqui, tive contato com tudo o que é bicho... é um zoo... já encontrei artistas, esportistas, políticos. Dia desses, o prefeito tava na padoca. Sim.. vim saber que ele mora há poucas ruas de mim.

Já presenciei cenas que não gostaria... Garçon de padaria ser maltratado... nada a ver. E a dondoca ainda quis me encarar... barraqueira, de primeira, levantei a crina e perguntei: qualé, madame?... como eu imaginava, ela baixou os olhos, envergonhada não com o que tinha feito, mas preocupada em não dar escândalo... pensei, vitoriosa: Se ela soubesse de onde eu vim, nem olhava pra minha cara. É... sempre me orgulho da perieria! Rs

Mas hoje foi a cena cabal! Juro, hoje especialmente, eu não gostaria de ter visto e ouvido o que vi e ouvi. Resolvi almoçar na mesma padoca do prefeito. Ambiente perfeito... pessoas falando baixo, TV sem som (!?), musiquinha ambiente. Comida honesta. O preço não muito.. mas a estratégia foi boa. Pego coisinhas leves, pra não passar de meio quilo (afinal, o quilo é muuuito caro!).

Sentei feliz, sozinha na mesa! Coloquei a bolsa na cadeira da frente... ninguém mais caberia naquele metro quadrado. Ledo engano. A mesa do lado cheia. Dondocas. Ahhh, pára. Se você perguntar a elas, todas trabalham, dão duro, pagam impostos e até fazem uma ou outra açãozinha social... pra se livrar da culpa.. quando uma criança vier bater no vidro do carro, numa noite de chuva, elas pensam: não! Já contribuo com a ONG tal... minha empresa é certificada pela Abrinq com o selo “empresa amiga da criança” e, além de TUDO ISSO, eu pago meus impostos. O governo que não faz nada!

Daí, uma delas começou a falar que está indo em uma instituição de menores infratores. E a outra perguntou: ‘ui, amiga, pra que você tá indo lá???’. E ela: ‘ahhhhh, lembra aquele perfume que ‘encontraram’ na minha bolsa quando eu saía da loja tal? Então, deu nisso! Tenho que ir lá uma vez por semana, durante seis meses!’

Olhei pra ela. Sim! Tive que olhar... vai que eu tenha que reconhece-la futuramente! E ainda deixei minha bolsa longe da vista dela, claro. Tudo bem, não tem nada na minha bolsa, mas quem se queima por um perfume, pode se queimar por uma bolsa do mickey.

E a conversa continuou. Ela perguntou pra um guri por que ele estava ali. E ele: eu fui pego roubando farinha de milho num mercado no bairro... correram atras de mim, e eu fugindo quebrei uma garrafa e cravei na barriga do guardinha que me pegou.

A dondoca-claptomaníaca (ladra, mesmo!), rosa-chiclete, perguntou-se, falando com as ‘migas’: como uma pessoa se deixa pegar roubando farinha de milho?

Lógico! O must é ser pego roubando perfume de grife!!!

Sempre tive a impressão que a classe-média é o escarro da sociedade. Hoje eu tive certeza.

Analise comigo: o pobre ladrão é mandado pro presídio, aonde fica anos esperando por um julgamento. O rico ladrão paga propina e nunca passa por um julgamento. O medio-classista ladrão, paga a pena prestando ações para a sociedade. Como se ele prestasse pra alguma coisa! Como se ele tivesse valores e conceitos a ensinar pra alguém? Me diga! O que uma mulher dessa pode ensinar pra um menino desses? A roubar com classe? A ser pego e alegar doença mental?

Masssss.. atire a primeira pedra! Conversando com uma amiga, lá pelas tantas ela falou: sim.. a gente só se mete em encrenca, mas saímos dela com classe, de salto alto! Pelo menos não roubamos perfume! e eu: é... não roubamos o vidro todo!!! Fala sério! Quem nunca entrou numa loja de perfume pra dar uma 'experimentadinha' naquele perfume de 200 reais? Ou dar uma retocada na maquiagem antes da balada? (rsrsrsrsrsrsrs)..

É... a classe-média me envergonha!

2 comentários:

  1. Não é fácil não! Muitas vezes me pergunto se existe alguma coerência na hipócrita e desorientada sociedade acéfala.
    Um dia desses estava eu, sentado em uma cadeira da Sala São Paulo tentando entender um emaranhado de notas soltas e sem sentido de um concerto repugnante de Richard Strauss. Ao final do embrólio a platéia ovacionou esfusiantemente a performance da orquestra, que por sinal foi impecável. Pena ter sido "aquela peça".
    Pior (ou melhor) é que o saldo do dia foi positivo, pois retornando para o meu lar, atordoado ainda pela minha ignorância musical, me deparo com um acrobata de semáforo a fazer seus 30 segundos de acrobacias com uma bola de vidro. Foi lindo, deslumbrante e emocionante! Que coisa! A apresentação da Sala São Paulo custou, não a mim, pois ganhei, R$60,00!
    Paguei R$1,00 ao acrobata.

    É...a classe média me envergonha!

    Rê, parabéns pela sua iniciativa!!! Belo Blog, mas continue a escrever!!!

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  2. uauuu!...meu Deus...como eu ainda sou ingenua...

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